Avançar para o conteúdo

JUSTIÇA NO CAMPO

“Para fortalecer a imigração e aumentar o trabalho agrícola, importa que seja convertida em lei, como julgar vossa sabedoria, a proposta para o fim de regularizar a propriedade territorial e facilitar a aquisição e cultura das terras devolutas. Nessa ocasião resolvereis sobre a conveniência de conceder ao Governo o direito de desapropriar, por utilidade pública, os terrenos marginais das estradas de ferro, que não são aproveitados pelos proprietários e podem servir para núcleos coloniais.” D. Pedro II, Última Fala do Trono, 3 de maio de 1889.

A questão agrária é um tema que sempre suscita inflamadas disputas no Brasil. Ao debate tradicional entre o direito absoluto de propriedade e a questão da “função social”, reconhecida na Constituição Federal, somam-se as complexidades associadas ao sucesso do “agronegócio” brasileiro. Há, também, aqueles que enxergam na discussão sobre as injustiças no setor agrário uma forma de manter acesas esperanças de caráter revolucionário.

Nós, da Comunhão Popular, acreditamos ser um erro encarar a agricultura apenas pela perspectiva materialista, como se fosse sinônimo de “agronegócio”. Nenhum país do mundo faz isso. Se, por um lado, é verdade que a produção rural é parte imprescindível da geração de riqueza do país, estando ligada aos principais ciclos econômicos da nossa História, por outro, a agricultura não se reduz a um negócio comercial. O mundo rural se confunde com a construção da cultura brasileira, da nossa segurança, da nossa organização social, dos nossos valores e da identidade nacional.

Além disso, é preciso lembrar que a agricultura brasileira não é homogênea. Convivem no campo a agricultura intensiva em capital e tecnologia e a pequena agricultura familiar de subsistência. Às vezes se misturam, às vezes competem, mas a corda estoura, obviamente, do lado mais fraco. Os ganhos recentes dos avanços da agricultura concentram-se no primeiro grupo, ao passo que exercem grande pressão sobre a viabilidade da manutenção do segundo. Assim, uma resposta para a questão agrária brasileira precisa contemplar tanto os pequenos produtores rurais e os sem-terra quanto os grandes produtores.

Corre, porém, um mito de que essa seria uma discussão ultrapassada no Brasil. Todos os problemas “da porteira para dentro” estariam resolvidos, os grupos mais aguerridos de “luta camponesa” estariam pacificados e caberia ao Brasil apenas abrir mercados internacionais e construir infraestrutura para escoar a produção. Esses são, de fato, desafios reais, e o país passou em três décadas de importador líquido a maior exportador líquido de alimentos do mundo. No entanto, ainda vemos muita pobreza e vulnerabilidade do trabalhador do campo, que sofre tanto por falta de acesso à terra quanto de capital, cada vez mais intensivo na lavoura, além da precarização de direitos. Setores tradicionalmente ligados à pequena propriedade familiar, como a produção leiteira, são particularmente afetados.

A Comunhão Popular está atenta às dificuldades do trabalhador rural brasileiro. Lemos a última Fala do Trono de Dom Pedro II e os escritos de Joaquim Nabuco e de José Bonifácio e vemos uma obra ainda por fazer. Os ganhos recentes do Brasil como potência agrícola precisam ser distribuídos em prol da superação das vulnerabilidades do trabalhador rural e da família camponesa. Nessa tarefa, é necessário contar com todo o rol de políticas disponíveis na nossa Constituição, inclusive a reforma agrária de terras devolutas e improdutivas, realizada por meios pacíficos e de acordo com o devido processo legal. É preciso, ainda, desenvolver políticas de atenção especial ao pequeno agricultor, esteio da segurança alimentar do Brasil e guardião da cultura nacional.

Sob Deus e com os pobres,
A Comunhão Popular

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *