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TODA SOLIDARIEDADE À IGREJA DA NICARÁGUA!

Nos últimos meses, o mundo todo tem acompanhado, em choque, o noticiário da Nicarágua, em especial as sucessivas e graves perseguições do presidente Daniel Ortega à Igreja Católica, maior comunidade religiosa do país, profundamente ligada à sua história nacional. O conflito do governo nicaraguense com a Igreja já existe há alguns anos, mas assumiu uma forma especialmente violenta nos últimos tempos, com ações cada vez mais brutais.

Em março, de maneira completamente arbitrária, foi expulso do país o bispo polonês Waldemar Sommertag. Ele exercia a função de núncio apostólico, ou seja, de representante diplomático oficial da Santa Sé e do Vaticano. Em julho, mais um exílio forçado. Desta vez, das Missionárias da Caridade, uma ordem religiosa de ajuda aos pobres. Fundada por Madre Teresa de Calcutá, a congregação foi bizarramente acusada de não respeitar a “legislação em vigor sobre lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo e armas de destruição em massa”. Já neste mês de agosto, a repressão se encaminhou para o campo da mídia. Alegando pretextos técnicos, o governo Ortega simplesmente decretou o fechamento sumário de sete emissoras de rádio católicas, uma das quais pertencente à própria Conferência de Bispos. Enfim, chegou o momento das prisões. Primeiro, três padres, dentre os quais Oscar Benavídez, acusados todos de conspirar contra o Estado e organizar grupos violentos. Depois, na madrugada da última sexta-feira, o auge trágico de todo o absurdo. Dom Rolando Álvarez, bispo de Matagalpa, que já se encontrava há quinze dias sitiado em seu palácio episcopal, foi detido pela polícia e levado à força para uma prisão domiciliar na capital, Manágua.

São tantas arbitrariedades e injustiças evidentes que uma rede internacional de solidariedade está se formando. Assim, não apenas autoridades religiosas, como o Papa Francisco, têm condenado duramente os desmandos de Daniel Ortega, mas também figuras políticas de relevo, como o secretário-geral da ONU, António Guterres. Em nosso país, a CNBB, tal como muitas comunidades religiosas das Américas do Sul e do Norte, também manifestou oficialmente seu protesto, convidando os fiéis à oração e a uma solidariedade efetiva com a Igreja nicaraguense.

Nós, da Comunhão Popular, um movimento político de inspiração cristã, pautado pela Doutrina Social da Igreja, condenamos com toda a veemência o que vem ocorrendo na Nicarágua e expressamos toda a nossa solidariedade aos cristãos e às cristãs nicaraguenses.

A liberdade religiosa é a mais fundamental de todas as liberdades civis. Ao respeitá-la, o Estado admite que existe uma instância superior da realidade, que ultrapassa a vida social, e que só pode ser aceita e vivida pela fé livre. O poder público reconhece, assim, a inviolabilidade das consciências das pessoas e recusa ter qualquer poder sobre elas. Por sua vez, quando a liberdade religiosa é violada, quando o Estado acredita que pode tutelar ou governar a Igreja, não há mais nada que limite a tirania e o autoritarismo. Se o homem não pode ser livre para prestar culto a Deus, para o que será ele livre então?

A história da América Latina, aliás, especialmente nas últimas décadas, está repleta de provas sobre a ligação essencial que existe entre a liberdade religiosa e a garantia das outras liberdades civis, como a de expressão, de manifestação e de ir e vir. Em momentos autoritários, de fechamento de regime e repressão aos opositores, a Igreja sempre tem funcionado, em nosso subcontinente, como o grande polo de resistência da sociedade civil organizada, colocando-se ao lado dos pequenos e fracos. Foi assim no Brasil, durante a ditadura militar de 1964, em que vários bispos denunciaram a tortura e abrigaram perseguidos políticos. Bispos, diga-se, não apenas ditos “progressistas”, mas também bastante “tradicionais”, como Dom Eugênio de Araújo Sales, que, mesmo discordando severamente de suas ideias, deu guarida a centenas de fugitivos em seu palácio episcopal. Foi assim também em El Salvador, durante a sanguinária ditadura militar dos anos 80, contra a qual se levantou com toda força São Óscar Romero, o Voz dos sem voz, padroeiro da Comunhão Popular. Romero, inclusive, foi brutalmente assassinado por um esquadrão paramilitar de extrema-direita, durante a celebração de uma missa, apenas um dia depois de ter exigido em público, invocando a sua autoridade de sucessor dos apóstolos, que o governo parasse imediatamente a repressão.

A tragédia da Nicarágua, portanto, não é bem compreendida se a reduzimos a uma mera questão ideológica – a ameaça socialista ou coisa que o valha – como querem fazer parecer alguns, para tirar da desgraça dos outros algum proveito político. O esquerdista Daniel Ortega persegue hoje a Igreja, em seus arroubos ditatoriais, assim como figuras autoritárias de direita a perseguiram também noutros momentos. E é natural que seja assim. De fato, na medida em que se mantém fiéis ao anúncio do Evangelho, na medida em que estão realmente comprometidos com as transformações sociais e políticas que brotam da fé e não de seus caprichos ou da submissão inconsciente a projetos de poder, os cristãos sempre correm o risco de serem vistos como inimigos por ideologias deste mundo, à direita e à esquerda, progressistas ou conservadoras.

“Se sofrem por causa da justiça, felizes de vocês!” – disse o Apóstolo – “Não tenham medo deles, nem fiquem assustados. Ao contrário, reconheçam de coração o Cristo como Senhor, estando sempre prontos a dar a razão de sua esperança a todo aquele que a pede a vocês, mas com bons modos, com respeito e mantendo a consciência limpa. Assim, quando vocês forem difamados em alguma coisa, aqueles que criticam o bom comportamento que vocês têm em Cristo ficarão confundidos. Pois, se é da vontade de Deus que vocês sofram, é melhor que seja por praticarem o bem, e não o mal” (1Pd 3, 14-17)

Oremos pelos nossos irmãos nicaraguenses e sigamos seu exemplo de perseverança na adversidade. Que cesse imediatamente a perseguição do governo Daniel Ortega!

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