Muitas das desgraças que se abatem hoje sobre a sociedade brasileira são públicas, escancaradas, fáceis de notar. É o caso da fome, do desemprego, do aumento do custo de vida, da violência urbana, da péssima qualidade da educação, das falhas do sistema de saúde. Mas há também entre nós um grande mal, que, apesar de extremamente perigoso, permanece discreto, silencioso e sutil: a cultura da pornografia.
Obviamente, esse não é um fenômeno peculiar do nosso tempo. Sempre houve quem procurasse por imagens íntimas de terceiros. Hoje, porém, com a expansão da internet, esse acesso está muito mais fácil, apenas a um clique de distância. Ao mesmo tempo, ganha cada vez mais força na sociedade uma tendência a se naturalizar o consumo de pornografia, seja por considerá-la inofensiva, seja até mesmo por julgá-la boa. Uns, numa lógica machista, louvam o vício como necessário para o sujeito “virar homem de verdade”. Outros, numa visão mais “desconstruída”, acham que ele é uma prática essencial para uma vida moderninha.
O que se ignora, ou se busca esconder, é que o consumo de material pornográfico é sempre uma gravíssima violação da dignidade humana. Como diz o filósofo conservador britânico Roger Scruton, “na pornografia, o rosto não tem papel a desempenhar, exceto o de ser submetido ao império do corpo. Os beijos não têm importância, e os olhos viram-se para o nada, já que não se busca nada além do prazer imediato. Tudo isso corresponde a uma marginalização, efetivamente uma espécie de profanação, do rosto humano. E essa profanação do rosto é também uma anulação do sujeito. O sexo, na cultura pornográfica, não é uma relação entre sujeitos, mas uma relação entre objetos.”
A sexualidade é um dos mais preciosos dons de Deus. Sua vocação é ser vivida no amor, como uma experiência de intimidade completa. Não apenas uma intimidade física, de corpos nus se entrelaçando, mas também uma intimidade espiritual, de duas almas que se entregam plenamente uma à outra, em todos os sentidos. Na pornografia, ao contrário, a sexualidade fica desconectada do amor e é reduzida ao puro desejo. Nela, o outro não é visto como uma pessoa, alguém que se respeita e se quer bem, mas apenas como uma coisa, um objeto, algo que se usa de maneira egoísta e se descarta logo a seguir. Essa distorção gera consequências graves – para quem consome material pornográfico, para quem se envolve em sua produção e para a sociedade como um todo.
Entre os consumidores, são frequentes os problemas no trabalho e na vida de estudos. O próprio desempenho sexual é prejudicado, e, por consequência, os relacionamentos amorosos. Família e casamento são postos em risco. De fato, é difícil se manter bem quem vive alienado na fantasia do “sexo virtual”. Há uma verdadeira fuga da realidade. Movido por falsas promessas de libertação, o homem tem sua liberdade roubada, aos poucos, sem se dar conta, até cair completamente na prisão dos seus próprios vícios.
O maior drama, no entanto, é certamente o das pessoas que atuam em produções pornôs. E o motivo é simples: na prática, a pornografia é apenas uma variante da prostituição. Tanto num caso quanto no outro, ainda que em formas diversas, são pessoas exploradas, objetificadas e diminuídas. Essa relação abusiva e cruel tem como vítimas preferenciais as mulheres. Seus corpos são submetidos à lógica do consumismo mais perverso, tratados apenas como mercadorias, como carnes no açougue. Isso desumaniza. Não à toa, atrizes pornográficas frequentemente enfrentam problemas com depressão, drogas até suicídio.
Em uma época na qual se fala tanto de libertação da mulher, chega a ser ofensivo perceber o quanto esse problema é ignorado. E o silêncio dos chamados “progressistas” fica ainda mais ensurdecedor quando fazemos a pergunta fundamental: quem ganha com tudo isso? Quem se beneficia com a exploração de corpos alheios? Com efeito, bem longe de ser um simples e solitário exercício de liberdade sexual, a pornografia é um grande negócio, uma indústria capitalista no sentido mais perverso possível. Trata-se, sem exagero, de um dos mercados mais lucrativos do mundo, responsável direto pelo enriquecimento de magnatas.
O Catecismo da Igreja Católica afirma categoricamente que “as autoridades civis devem impedir a produção e a distribuição de material pornográfico”. Segundo a Doutrina Social Cristã, portanto, esta não é apenas uma questão ética ou religiosa, mas um problema político, diretamente ligado ao bem comum. A legislação brasileira reconhece isso, ainda que na prática, infelizmente, a lei não seja aplicada. Diz o Código Penal, em seu artigo 234, que é crime “fazer, importar, exportar, adquirir ou ter sob sua guarda, para fim de comércio, de distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura, estampa ou qualquer objeto obsceno”.
Nós, da Comunhão Popular, temos a convicção de que a indústria pornográfica precisa acabar. Ao mesmo tempo, possuímos uma postura realista. Reconhecemos o quanto a hipersexualização está enraizada na sociedade e sabemos que um problema dessa natureza não se resolve do dia para a noite, numa canetada. Propomos, assim, no curto prazo, três medidas bastante concretas, que não encerram a questão, mas ao menos nos aproximam da direção adequada.
Em primeiro lugar, é preciso que o Estado, em parceria com a sociedade civil, realize amplas campanhas de conscientização sobre os danos da pornografia, sobretudo entre os jovens. Além disso, deve-se criar uma rede de apoio e assistência a pessoas que estão envolvidas em produções pornográficas, mas desejam abandonar a atividade. Por fim, é essencial impedir de fato que menores de idade tenham acesso a material obsceno na internet. Para tanto, propomos a criação de uma lei que exija dos usuários de “sites adultos” não apenas que se declarem maiores de 18 anos, como é hoje, mas que os obrigue a apresentar ao site um documento civil comprobatório de sua idade. Tal procedimento, além de restringir o acesso de adolescentes, vai inibir também o de adultos, visto que o anonimato normalmente é parte fundamental da coisa.
Dizia Santo Tomás de Aquino, na trilha de Platão e Aristóteles, que a primeira e mais essencial função do Estado é promover a virtude, é induzir os cidadãos a serem pessoas melhores. Assim também pensamos nós.
Sob Deus e com os pobres,
A Comunhão Popular.