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O ESCÂNDALO DE PIO XI

Dom Josef-Léon Cardijn (1882-1967) foi uma das figuras mais importantes para a difusão da doutrina social cristã no século passado. Vindo de uma família muito pobre, o cardeal belga sensibilizou-se desde cedo com os dramas da classe trabalhadora. Percebeu, em especial, como os operários de seu país, submetidos às condições de trabalho desumanas, acabavam muitas vezes por rejeitar a Igreja Católica, vendo-a como uma aliada de seus exploradores.

Indignado com este cenário, Cardijn partiu para a ação. Sua principal obra foi a fundação da JOC (Juventude Operária Católica), organização que se espalhou por todo o mundo. Além disso, criou também o método Ver-Julgar-Agir, uma nova forma de ensino da Doutrina Social da Igreja, assumido oficialmente no documento “Mater et Magistra”, de 1961.

Nem tudo, porém, foram glórias na vida do fundador da JOC. Seu ímpeto apostólico junto aos trabalhadores enfrentou resistências e perseguições. Os adversários – como, infelizmente, é comum até hoje – acusavam-no de “comunista” e “herege”. Aflito, Cardijn solicitou uma audiência privada com Pio XI.

Ora, o papa não apenas o recebeu, como o tranquilizou e abençoou suas iniciativas. Mais: fez-lhe uma confidência pessoal, de algo que o angustiava profundamente. “O maior escândalo do século XIX”, disse o Santo Padre, “foi a apostasia da classe trabalhadora”.

Como será possível – perguntava-se o papa – que, desde a Revolução Industrial, os trabalhadores tenham se afastado tanto da fé? Justamente os mais pobres, os prediletos de Deus! Pois a resposta do escândalo de Pio XI – ele mesmo pressentia isso – estava naquilo que Joseph Cardijn notou desde moço: quando os cristãos não se colocam decididamente ao lado dos trabalhadores e de suas necessidades, os pobres abandonam a fé, confundindo a verdade do Evangelho com o mau exemplo dos fariseus.

Hoje, o trabalhador está abandonado de todos os lados. No Brasil, por exemplo, começamos o segundo turno das eleições presidenciais discutindo acusações de satanismo, maçonaria e canibalismo – mas quem está com o trabalhador precarizado, esmagado entre dois ou três empregos, vendo os preços subirem e com medo do filho se envolver com as drogas?

Os supostos defensores tradicionais da classe trabalhadora abrem um álbum de recordações, para dizer que tudo foi bom quando governaram e voltará a ser como antes, como se o cenário atual tivesse surgido do nada. A outra opção, atualmente no governo, fala de empreendedorismo, educação financeira e sucesso à base de esforço, como se o trabalhador não vivesse dignamente por falta de vontade.

Em tal estado de desamparo, quem deseja salvar as almas e combater a apostasia do mundo pós-cristão deve sempre estar unido aos pequenos, aos últimos deste mundo. Ir até os pobres, escutá-los, caminhar com eles e lutar por sua dignidade. Nós, da Comunhão Popular, assumimos hoje essa missão, nada fácil, animados por exemplos com o do cardeal Cardijn e do Papa Pio XI.

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