14 de fevereiro de 1981, Jacareí, cidade há cerca de 80 quilômetros de São Paulo. Durante uma rebelião na penitenciária local cinco detentos, um policial e um advogado foram mortos no confronto. O advogado chamava-se Franz de Castro Holzwarth.
Franz desejava viver a vocação sacerdotal, mas a vida guiou-o por outro caminho, sem, no entanto, ofuscar sua fé. Convidado a ser catequista de um grupo de presos e prepará-los para receber o Sacramento da Crisma, encontrou seu lugar na história. Através de seu trabalho com os apenados, conheceu a APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados).
A APAC significava inicialmente “Amando o Próximo, Amarás a Cristo” e nasceu do coração inflamado pela caridade de Mário Ottoboni. Atuante no Movimento dos Cursilhos de Cristandade, nos Vicentinos e na Pastoral Carcerária, foi nessa última que encontrou o maior desafio de por em prática as palavras do Cristo: “amar ao próximo como a si mesmo”. Pela causa dos encarcerados, Mário doou-se a vida toda e Franz doou toda vida.
O padre Julián Carrón, que foi presidente do movimento “Comunhão e Libertação” (2005-2021), narra o caso de um egresso da APAC do qual teve conhecimento:
“Recentemente, me contaram a história de um detento brasileiro que fugira de muitos presídios de seu país. Num determinado momento, chegou a um desses presídios que não têm policiais nem armas, as APACs, uma experiência nascida algumas décadas atrás de um grupo de voluntários cristãos guiados pelo advogado Mário Ottoboni. O juiz que o mandara para lá, depois de alguns meses, quis verificar como haviam acabado as idas e vindas desse detento. Ele foi e o encontrou ali, naquela prisão da qual poderia ter fugido facilmente. ‘Por que você não fugiu daqui?’, perguntou-lhe. ‘Porque aqui me senti amado, e do amor ninguém foge.’”
Eis a metodologia da APAC: criar um ambiente onde habite o amor. E como se canta na Missa de “Lava-pés”: onde há caridade e amor, Deus aí está.
Nos presídios que aplicam a metodologia da APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados) os presos são chamados de “recuperandos” e são corresponsáveis por sua recuperação. É oferecida assistência espiritual, médica, psicológica e jurídica, através da presença marcante de voluntários.
Na APAC não há policiais ou agentes penitenciários. A segurança e a disciplina são feitas com a colaboração dos “recuperandos”, tendo o apoio de alguns funcionários e voluntários.
A média dos presídios brasileiros apresenta um índice de 80% de reincidência criminal entre seus egressos, já a APAC apresenta um índice de apenas 10%. O método APAC também se revela mais econômico, com um custo médio por preso de um salário mínimo, enquanto a média nacional é de até três salários mínimos. Vemos, portanto, não só uma perspectiva mais humana com relação aos apenados, mas um verdadeiro direcionamento em busca do bem comum.
O espírito cristão não se coaduna com a ideia de que “bandido bom é bandido morto”. O próprio Cristo se identifica com o encarcerado: “estava na prisão e viestes a mim” (Mt 25, 36).
“Se, no entanto, o mau renuncia a todos os seus erros para praticar as minhas leis e seguir a justiça e a equidade, então ele viverá decerto, e não há de perecer. Não lhe será tomada em conta qualquer das faltas cometidas: ele há de viver por causa da justiça que praticou. Terei eu prazer com a morte do malvado? – oráculo do Senhor Javé –. Não desejo eu, antes, que ele mude de proceder e viva?” (Ez 18, 21-23)
Seria ingenuidade crer que o modelo da APAC pode ser universalizado, tampouco somos defensores de uma imprudente política de desencarceramento. Ainda assim, a Comunhão Popular apoia e incentiva o modelo representado pela APAC, que ele cresça e se torne uma alternativa cada vez mais presente. Mário Ottoboni e o Servo de Deus Franz de Castro são para nós modelos no trato com os apenados e heróis nacionais. Sua luta por uma prisão mais humana é também nossa, refletindo numa sociedade mais justa e segura.
Sob Deus e com os pobres,
A Comunhão Popular