Os não iniciados no mundo do Direito talvez não saibam, mas por trás de decisões polêmicas e incertezas sobre crimes e penas, há uma monocultura de ideias. A filosofia do Direito segue dominada pelo positivismo jurídico. Em resumo, prevalece a noção de que o sistema jurídico deve permanecer completamente apartado da moral, funcionando como uma máquina que, bem programada, responderia sobre o que é permitido, o que é desejável e o que é proibido.
Nesse cenário, um dos grandes nomes do positivismo jurídico, o inglês Herbert Hart, instigou um divergente a escrever sobre a Lei Natural. Esse divergente era o australiano John Finnis, colega de Hart em Oxford, que aceitou o desafio. Em seu “Lei Natural e Direitos Naturais”, John Finnis toma como ponto de referência o desenvolvimento de Santo Tomás de Aquino a respeito do tema.
Acabou que esta obra foi um grande marco para a filosofia e teoria do Direito moderno, trazendo de volta ao meio jurídico a doutrina de Santo Tomás a respeito da Lei Natural. Essa apresentação da doutrina tomista gerou uma nova escola de pensamento, denominada de Nova Teoria da Lei Natural. Além de Finnis, Germain Grisez e Robert P. George também aderiram a esse esforço.
Em “Lei Natural e Direitos Naturais”, Finnis apresenta a doutrina de Santo Tomás e a desenvolve, de forma dialética, de acordo com os problemas suscitados a respeito do jusnaturalismo nos tempos atuais: a superação da “falácia naturalista”; a má-interpretação dos textos de Santo Tomás; a distinção entre razão especulativa e a razão prática, e a primazia desta na vida moral; a noção de bem comum e o papel das leis na ação humana; etc.
Finnis sustenta que as escolhas humanas se baseiam em bens básicos: a razão prática; a vida, incluindo a procriação dos filhos; o conhecimento; o entretenimento; a experiência estética; a sociabilidade; a religião, como fundamento metafísico da razão prática; e o casamento, fonte do florescimento humano. O bem comum inclui obrigações distributivas e comutativas de justiça dos homens na persecução dos bens básicos, e a moralidade é a expressão da razão prática que torna a vida digna de ser vivida respeitando essas obrigações.
As leis são elaboradas e aplicadas com base nessas condições, mesmo que se pautem em motivos mais imediatos. Quando não levam em conta as condições da razão prática, as leis perdem sua autoridade moral, e os indivíduos passam a inclinar-se para desconsiderá-las, já que não satisfazem a compreensão de uma vida boa. No entanto, afirma Finnis, essas leis permanecem vinculantes através dos procedimentos de execução do sistema legal. O significado da lei e a argumentação jurídica, no entanto, devem ser guiados por essa concepção da Lei Natural.
Tanto no “Lei Natural e Direitos Naturais” quanto em outros livros, como o “Aquinas”, encontram-se os mais sólidos argumentos a respeito da obrigatoriedade da lei e da norma moral; do papel pedagógico da lei para a razão prática; da tolerância que a sociedade deve ter com os males menos atentatórios ao bem comum; e do próprio bem comum para o desenvolvimento e amadurecimentos das pessoas na vida social.
Para quem pretende defender a Teoria da Lei Natural, a leitura de Finnis é fundamental. Apesar disso, não se pode esquecer que Finnis, junto com outros “tomistas analíticos”, sofre críticas dentro da tradição da Lei Natural e no tomismo, principalmente pela sua análise da doutrina dos Direitos Humanos a partir de Santo Tomás e pela secundariedade da Metafísica em sua obra. Ainda assim, continua sendo essencial a sua leitura.
E é por isso que a Comunhão Popular indica as obras deste grande autor. Além de apresentar o “estado da arte” quanto à tradição da Lei Natural e os problemas a ela levantados durante os tempos, Finnis elabora e desenvolve respostas eficazes e dignas de consideração para os nossos tempos. Isso faz com que a pessoa que leia, além de ter uma ideia mais clara das posições jusnaturalistas, tenha um verdadeiro testemunho de um filósofo em seu labor.
Sob Deus e com os pobres,
A Comunhão Popular